segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Uma noite num quarto azul...




Uma noite,então, ele não veio mais. Uma dessas noites, ele se cansou de subir as escadas sujas e tortuosas com ela (afim de fugir do elevador que ela, supersticiosamente ,evitava).Decidiu-se que seria mais seguro tentar uma casa plana, com uma mulher plana talvez, e uma vida plana.
Mas certas coisas correm de forma inevitável, como uma barragem rompida, levando tudo em seu caminho simplesmente porque é água e tem que correr até que se seque,até que se esgote.Era assim o amor dela, a devoção.
Ele tinha esquecido algumas coisas ali : uma camisa, um cinto, sapatos, uma cueca limpa (fato que ela lamentava, a limpeza ), uma garrafa quase terminada de seu whiskey preferido.Não era uma idéia que lhe ocorreu,como um plano.Foi um impulso como sede,uma necessidade.Colocou as peças queridas todas em cima da cama, olhando-as por longo tempo como costumava admirá-lo, com perfeita  calma, a intensidade de uma  mulher prestes a ser possuída, os lábios entreabertos.Já estava nua, e podia sentir a umidade entre as pernas brotando devagar, como uma velha cisterna que reencontra  seu uso.
Tomou a camisa entre as mãos, sentindo a maciez do tecido nobre, branco como sempre, bordado com pequenos losangos, minúsculos.Sentia o cheiro dele ainda, e isso fez com que um soluço dolorido deixasse seus lábios, mas quem escutasse poderia pensar tratar-se de um gemido baixo, de prazer.Talvez fosse.Demorou algum tempo para rasgar a camisa em tiras, as mais longas que o corte permitia, e reservou ao lado do cinto o resultado do trabalho. Depois foram os sapatos. Colocou-os diante de si,como se fosse ele ali, e ajoelhou-se como costumava quando queria render-lhe homenagem, quando queria-o na boca.Com a língua estendida lambeu o couro como se fosse a boca de seu homem,vezes sem conta até que os lábios estivessem secos e cortados com o contato rude.Queria-os cortados  ou não seria certo. Cheirou a parte de dentro, e por fim as solas.Desejava captar os passos dele, os lugares onde estivera com e sem ela,desejava ir com ele,mesmo que fosse daquela forma.
Quando se deu por satisfeita,pegou a garrafa do velho whiskey preferido Dele.Quantas vezes sentiu aquele cheiro forte esfregado em seu rosto.Ele gostava de lhe chupar entre as pernas, depois de tomar,e depois enfiava os dedos, trazendo logo depois à sua boca, para que ela mesma sentisse os gostos misturados, o dela, o dele, hálito e sexo.Antes,fazendo da peça íntima dele uma espécie de gag, uma bola macia em sua boca para conter gritos,derrubou o líquido âmbar no corpo todo.Deixou que escorresse pela saboneteira, sobre os seios,como um rio dourado,barriga, sexo, coxas, pernas, pé.Era como se purificar no Ganges para o que viria a seguir.
Com o corpo molhado de bebida, tomou o cinto nas mãos e erguida, consciente e viva, começou a se bater com o mesmo.Cintadas e mais cintadas, nas costas, nas coxas, peitos, rosto,cada vez mais altas, mais fortes, como o amor lhe crescia a cada respiração no peito.
Ardia.Ardia a pele molhada de álcool, e ela aproveitou as feridas que iam se abrindo para despejar mais da bebida.Não continha os gritos,abafados pelo algodão branco, e gemidos de prazer, e em sua mente era  Ele que a possuía em cada golpe.Como se fosse Ele.Eram Dele.Com sangue e whiskey misturados, exausta, ela se enrolou nas tiras da camisa, nós apertados.Prendeu as pernas, enrolou-as nos braços, no pescoço, e por fim ,com a ajuda da própria boca, prendeu-se nos pulsos.Deixou-se cair para trás, no chão, molhada de tantas maneiras, exausta e sentindo amada. Ele estava ali com ela,sempre estaria.



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